Véspera de feriado, relógio marcando 22:00h, não é um bom horário para se trabalhar, mas não tenho escolha, existem pessoas com fome e eu preciso atendê-las. Trabalho para uma grande rede de fast food numa empresa que fica á poucos metros da minha casa. Sentada numa cadeira na central de atendimento, olho para o monitor do computador sem saber ao certo se torço para receber uma ligação ou se tapo os ouvidos para as lamentações da atendente ao meu lado. Na verdade, não sei o que é pior. Por um momento me desligo daquele lugar, lembro de compromissos que terei na semana e trabalhos que preciso fazer. Faculdade! Nossa, tinha esquecido! O texto do blog. Começo a pensar. Penso, repenso e penso de novo, preciso de um tema para escrever algumas linhas no site. Paro, lembro das aulas e nada, nenhuma luz.
O telefone toca, alguém de algum lugar do país está ligando...
-Delivery 28 minutos Natália boa noite com quem falo?- atendo. Calculo que já tenha dito essa frase pelo menos umas 30 vezes só hoje
-Elza - responde do outro lado da linha
-Olá senhora Elza, a senhora fala do telefone 56336622?
-Sim – ela confirma
-Qual endereço para entrega?- pergunto
-E precisa?
-O pedido só chega na sua residência se tivermos o endereço...- não gosto de ironias, mas não foi possível deixar de usá-las.
-É na frente do bar do Zézão!
-Senhora, não conheço o bar do Zézão, preciso do endereço completo! Rua? Número?Bairro?Cep? – tenho esperança que o contato terminará em poucos segundos.
-Você não conhece? Então você não é baiana...- diz a mulher inconformada
-Não senhora, não sou! Nasci em São Paulo, moro em São Paulo, trabalho em São Paulo, e é de São Paulo que estou falando com a senhora!
-Ixii moça! Então vai “vim” caro à conta, é interurbano que cobra né?
Quero acreditar que ela está brincando. Espero, para que ela dê risada e diga que só foi uma piada para descontrair, mas ela não faz, então volto na linha.
-Para senhora estar falando comigo agora, a senhora ligou 0800, e 0800 é gratuito!
-I é? E como faço para fazer meu pedido?- pergunta, como se tivesse falando há 5 minutos com uma pessoa que não falasse a mesma língua que ela.
-A senhora pode fazer comigo, mas antes precisa informar o endereço para entrega – tenho certeza que um gravador nesse momento facilitaria bastante minha vida. E depois da pergunta a seguir, um remédio para o coração também.
-Tá, mas se você está em São Paulo e eu aqui, como vai chegar minhas esfihinhas?
-Envio seu pedido por sistema para loja mais próxima – na hora percebo que se ela não entendeu o 0800 ela não vai entender o sistema
-Sistema? Que sistema? Sedex?
Controlo minhas pernas que balançam impacientes, respiro fundo, não sou grossa, mas estou cansada e me pergunto como ela não entende a simplicidade do que explico. Tenho vontade de dizer: “É o correio que entrega, mas ao invés de ser na caixinha, é num envelope”, no lugar dessa estupidez me permito responder o último: “Não, senhora” àquela mulher.
Ela fica cismada, resmunga algo que não entendo, e desliga sem fazer o pedido, sem informar o endereço e sem entender o que exatamente aconteceu.
O silêncio paira
Meus pensamentos vão além, penso em algumas palavras na teoria de McLuhan que diz que: “o progresso tecnológico estava reduzindo o mundo à mesma situação que ocorre em uma aldeia, ou seja, a possibilidade de comunicar diretamente com qualquer outra pessoa que nela se vive...”
Lembro da mulher, penso que deveria ter sido mais paciente, talvez a teoria de Mcluhan não a convencesse, ou mais possível, talvez ela não conhecesse a teoria, enfim, nada adiantava mais, ela já tinha desligado e eu precisava atender a próxima ligação...
Natália Oliveira