sábado, 22 de março de 2008

Ela se recusou morar na aldeia...

Véspera de feriado, relógio marcando 22:00h, não é um bom horário para se trabalhar, mas não tenho escolha, existem pessoas com fome e eu preciso atendê-las. Trabalho para uma grande rede de fast food numa empresa que fica á poucos metros da minha casa. Sentada numa cadeira na central de atendimento, olho para o monitor do computador sem saber ao certo se torço para receber uma ligação ou se tapo os ouvidos para as lamentações da atendente ao meu lado. Na verdade, não sei o que é pior. Por um momento me desligo daquele lugar, lembro de compromissos que terei na semana e trabalhos que preciso fazer. Faculdade! Nossa, tinha esquecido! O texto do blog. Começo a pensar. Penso, repenso e penso de novo, preciso de um tema para escrever algumas linhas no site. Paro, lembro das aulas e nada, nenhuma luz.

O telefone toca, alguém de algum lugar do país está ligando...

-Delivery 28 minutos Natália boa noite com quem falo?- atendo. Calculo que já tenha dito essa frase pelo menos umas 30 vezes só hoje

-Elza - responde do outro lado da linha

-Olá senhora Elza, a senhora fala do telefone 56336622?

-Sim – ela confirma

-Qual endereço para entrega?- pergunto

-E precisa?

-O pedido só chega na sua residência se tivermos o endereço...- não gosto de ironias, mas não foi possível deixar de usá-las.

-É na frente do bar do Zézão!

-Senhora, não conheço o bar do Zézão, preciso do endereço completo! Rua? Número?Bairro?Cep? – tenho esperança que o contato terminará em poucos segundos.

-Você não conhece? Então você não é baiana...- diz a mulher inconformada

-Não senhora, não sou! Nasci em São Paulo, moro em São Paulo, trabalho em São Paulo, e é de São Paulo que estou falando com a senhora!

-Ixii moça! Então vai “vim” caro à conta, é interurbano que cobra né?

Quero acreditar que ela está brincando. Espero, para que ela dê risada e diga que só foi uma piada para descontrair, mas ela não faz, então volto na linha.

-Para senhora estar falando comigo agora, a senhora ligou 0800, e 0800 é gratuito!

-I é? E como faço para fazer meu pedido?- pergunta, como se tivesse falando há 5 minutos com uma pessoa que não falasse a mesma língua que ela.

-A senhora pode fazer comigo, mas antes precisa informar o endereço para entrega – tenho certeza que um gravador nesse momento facilitaria bastante minha vida. E depois da pergunta a seguir, um remédio para o coração também.

-Tá, mas se você está em São Paulo e eu aqui, como vai chegar minhas esfihinhas?

-Envio seu pedido por sistema para loja mais próxima – na hora percebo que se ela não entendeu o 0800 ela não vai entender o sistema

-Sistema? Que sistema? Sedex?

Controlo minhas pernas que balançam impacientes, respiro fundo, não sou grossa, mas estou cansada e me pergunto como ela não entende a simplicidade do que explico. Tenho vontade de dizer: “É o correio que entrega, mas ao invés de ser na caixinha, é num envelope”, no lugar dessa estupidez me permito responder o último: “Não, senhora” àquela mulher.
Ela fica cismada, resmunga algo que não entendo, e desliga sem fazer o pedido, sem informar o endereço e sem entender o que exatamente aconteceu.

O silêncio paira

Meus pensamentos vão além, penso em algumas palavras na teoria de McLuhan que diz que: “o progresso tecnológico estava reduzindo o mundo à mesma situação que ocorre em uma aldeia, ou seja, a possibilidade de comunicar diretamente com qualquer outra pessoa que nela se vive...”
Lembro da mulher, penso que deveria ter sido mais paciente, talvez a teoria de Mcluhan não a convencesse, ou mais possível, talvez ela não conhecesse a teoria, enfim, nada adiantava mais, ela já tinha desligado e eu precisava atender a próxima ligação...

Natália Oliveira

3 comentários:

Unknown disse...

O mundo que vivemos é esse!
Transformações a toda hora, evoluções tecnológicas.
Pergunto: até onde vai essa sede incessante de inventar coisas novas?
Eu um estudante de informática poderia responder algumas perguntas sobre o que já existe, mas me perco com tantas novidades que surgem a todo momento.
Usamos as novidades, mas não pensamos, muitas vezes, como funcionam.
Em frente ao meu computador digitando este texto e conversando com algumas pessoas no Messenger, olho em baixo da mesa que está meu teclado, olho os fios, vários, enroscados, misturados.
Vem-me em mente como posso conversar com essas pessoas por esses fios?
Estranho não?
Fios que me permitem enxergar e ouvir alguém à milhas de distância.
Benefícios! Estamos em busca..
Agora...
O que realmente me deixa contrariado, é a possibilidade de pessoas não entenderem que o mundo progride, que a tecnologia anda...

Emerson Alves

Carlos Gomes disse...

É gente infelizmente a pessoas que não tem o acesso as tecnologias ou não querem conhecer,estão no seu direito. Mas acredito que cada vez mais temos que nos adaptar as novidades se não ficamos parados no tempo,atrasados,bitolados,presos
pelas algemas que a humanidade nos impõe. Bjs e abrçs.

Felipe Perez disse...

Natalia parabéns. Outra pessoa no seu lugar, tinha desligado o telefone ou ter falado o que não deveria. Trabalho com o público e sei como é difícil o convivio com ele. Mas creio eu, que essa senhora, por via das dúvidas, nem se quer sabia o que estava fazendo ou até mesmo falando. É que na hora da fome, as pessoas esquecem tudo, menos as "esfihinhas", foi engraçado essa parte. Mas ainda bem que ela desligou o telefone sem fazer o pedido. Já pensou se você tivesse dito que iria pelo sedex, e ao invés de caixinha iria em um envelope e a "tia" ficasse a espera?? Rsrsrs...
É como o Carlos disse, "há pessoas que não tem o acesso as tecnologias ou não querem conhecer"...Mas é importante saber, adaptar-se as novidades, pois se não, ficaremos presos ao tempo.